13 de setembro de 2025

Carta 96 – Viver é ser soldado, Lucílio!

Por lucianakeiko@gmail.com

Continuas então a indignar-te ou a lamentar-te disto ou daquilo, sem entenderes que o único mal efetivo é o próprio fato de tu te indignares ou te lamentares?! Se queres saber a minha opinião, eu entendo que nenhum motivo de aflição existe para o homem além da própria circunstância de ele julgar que a natureza contém em si motivos de aflição.

No dia em que eu deixar de poder suportar o que quer que seja, deixarei de poder suportar-me a mim mesmo. Falta-me a saúde: é parte do meu destino. Os escravos adoeceram: os rendimentos foram-se, a casa abriu rachas, caíram sobre mim prejuízos, ferimentos, preocupações, perigos: tudo isso é natural. Direi mesmo mais: é inevitável! São condições a que estamos obrigados, e não meros acidentes.

Se tens alguma confiança em mim, revelar-te-ei totalmente os meus mais íntimos sentimentos: eu formei o meu carácter no meio de toda a espécie de circunstâncias aparentemente desfavoráveis e duras; mas não me limito a ceder à vontade dos deuses, dou-lhes mesmo a minha concordância; submeto-me espontaneamente, e não apenas por tal ser inevitável. Nunca me acontece nada que eu receba com amargura ou de má cara; não há imposto algum que eu pague contra vontade.

Ora, todas as ocorrências que nos causam gemidos ou receios são somente os impostos que a vida nos exige. De tais impostos, meu caro Lucílio, não poderás esperar, nem sequer pedir, isenção! Andaste aflito com uma dor na bexiga, recebeste notícias pouco consoladoras, tens sofrido contínuos prejuízos – irei mesmo mais longe, estiveste em risco de vida. E então, quando desejavas chegar a velho não sabias que tudo isso estava implícito no teu desejo?

Numa longa vida encontra-se de tudo, tal como numa estrada longa se encontra poeira, lama e chuva.

“Eu desejava viver, sim, mas ao abrigo de todas essas contrariedades!”

Ah, que palavras tão efeminadas, tão indignas de um homem! Vamos a ver como tu aceitas este voto que eu te faço – e faço-o não só de boa vontade mas com a melhor das intenções: possam todos os deuses conseguir que a fortuna nunca te cubra com as suas boas graças.

Pergunta a ti próprio, no caso de algum deus te proporcionar a opção, se preferirias viver num mercado ou num acampamento militar.

É que viver, Lucílio, é uma milícia! Os homens que são mandados para a frente, que realizam marchas forçadas e duras por montes e vales, que afrontam as missões mais arriscadas, esses são os heróis, são os soldados de elite; aqueles que se deixam ficar covardemente numa vergonhosa ociosidade, enquanto os camaradas afrontam o risco, não passam de “umas rolinhas” que se escondem dos ataques!

Passar Bem!