12 de junho de 2025

Carta 3 – Confiar em todos ou não confiar em ninguém é um erro

Por lucianakeiko@gmail.com

Dizes-me que entregaste a carta a um amigo teu, para me trazer, mas em seguida aconselhas-me a não trocar impressões com ele sobre quanto te diz respeito, pois nem tu próprio o costumas fazer. Quer dizer, na mesma carta deste-lhe e recusaste-lhe o título de “amigo”.

Ora bem: se tu usaste esta palavra não no seu verdadeiro sentido mas antes em sentido genérico, e lhe chamaste “amigo” tal como a todos os candidatos nós chamamos “respeitáveis cidadãos”, ou como às pessoas que encontramos e cujo nome nos não ocorre, cumprimentamos como “senhor fulano” ainda é aceitável; se consideras, porém, “amigo” alguém em quem não confias tanto como em ti próprio, então cometes um erro grave e mostras não conhecer bem o significado da verdadeira amizade.

Delibera em comum com o teu amigo mas começa por formular sobre ele um juízo correto: após o início da amizade, há que ter confiança. Antes, sim, é que se deve ajuizar. Confundem as obrigações inerentes a este princípio aqueles que, ao contrário dos ensinamentos de Teofrasto, formulam juízos depois de iniciada a amizade, e não estabelecem relações de amizade depois de formularem juízos. Pensa longamente se alguém é digno de que o incluas no número dos teus amigos; quando decidires incluí-lo, então recebe-o de coração aberto e fala com ele com tanto à-vontade como contigo próprio.

Pelo teu lado, vive de tal maneira que não tenhas de confiar a ti mesmo nada que não pudesses confiar até a um inimigo pessoal; como, todavia, há certas coisas que, por hábito, são consideradas íntimas, compartilha com o teu amigo todos os teus cuidados, todos os teus pensamentos. Se o considerares um amigo leal, é isso o que farás. Pessoas há que, no terror de serem enganadas, como que ensinaram os outros a enganá-las e pelas suas suspeitas justificaram as faltas dos outros. Que motivo pode levar-me a medir as minhas palavras diante de um amigo? Que motivo pode levar-me a não me considerar diante dele como se estivesse sozinho? Há quem conte ao primeiro passante aquilo que apenas se deve confiar aos amigos, e confie aos ouvidos de qualquer um o segredo que o consome; a outros, pelo contrário, repugna dar conhecimento ainda aos amigos mais íntimos e, se pudessem, não confiando sequer em si mesmos, interiorizariam tanto quanto possível todo o segredo.

Não devemos fazer uma coisa nem outra; qualquer delas – ou confiar em todos ou não confiar em ninguém – é um erro; apenas diria que a primeira é um erro mais honroso, e a segunda, mais seguro.

Deste modo, são igualmente censuráveis quer os que andam sempre inquietos quer os que vivem em perpétua calma. De fato, não é diligência o comprazimento com a confusão mas apenas correria de um espírito sobreexcitado; e não é calma a recusa de todo o movimento como se fosse uma doença mas apenas indolência e moleza. Por isso devemos conservar bem presente aquela descrição que encontrei na obra de Pompónio:

“houve quem se refugiasse na escuridão com a ideia de que tudo quanto está em plena luz é marcado pela confusão. “

Há que dosear as duas coisas: importa agir mesmo mantendo a calma, importa manter a calma mesmo quando se age. Confronta a tua atitude com a da natureza: esta te dirá que criou igualmente o dia e a noite.

Passar bem!